Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.
Mas as coisas findas,
muito mais que lindas,
essas ficarão.
Pegamos emprestadas as palavras de Carlos Drummond de Andrade para apresentar o tema da segunda edição da Deriva: memória — como também se intitula o poema de Drummond, publicado em 1951. Dessa vez, o conteúdo da revista será publicado ao longo da semana, entre 22 e 31 de outubro. Uma edição que pretende adentrar caminhos tão obscuros já começa borrando a precisão do calendário, tendo um intervalo como data de publicação.
Antes fosse um artifício editorial e não uma limitação: como a memória, os projetos independentes desafiam esquematismos. Em O Livro por Vir (1959), Maurice Blanchot escreveu que a obra por vir seria aquela que pensaria a si mesma.
“(…) reservar o indeciso na decisão, preservar o ilimitado junto ao limite, e nada dizer que não deixe intacto todo o espaço da fala sobre a possibilidade de dizer tudo.”
Blanchot defende a ideia de “manter a busca em aberto nesse lugar onde encontrar é mostrar rastros”. Pois, aqui, a revista por vir se propõe a seguir essa direção — “porque se trata de uma obra ao mesmo tempo toda presente e toda em movimento”. Seguimos deslizando entre passado, presente e futuro para investigar esse que é um dos conceitos mais impossíveis entre todos os conceitos: a memória, ela própria uma ilha de edição.
A artista convidada para ilustrar este número foi Carolina Nazatto, que nos encantou pela sensibilidade e pelo comprometimento. Agradeço também às autoras e aos autores que gentilmente aceitaram o convite para fazer parte dessa jornada, bem como a Thiago Thomé Marques, editor de arte da Deriva, pela diligência e apoio editorial.
Boa leitura!
Fabiane Secches
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